domingo, 27 de setembro de 2015

Vítimas da exploração e da violência são excluídas da escola.


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Toda criança deve, por lei, ingressar na pré-escola aos 4 anos para uma trajetória de Educação Básica que só termina aos 17, no fim do Ensino Médio. O direito, porém, não é realidade para milhares de meninos e meninas que estão fora da escola por diferentes tipos de exploração e violência. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2009, 40.470 crianças e adolescentes de 5 a 14 anos trabalham e não estudam. Para compor um retrato mais fiel do problema, a estatística oficial é insuficiente. Ela não inclui parte dos 611.961 indivíduos da mesma faixa etária que realizam atividade remunerada e, a rigor, estão matriculados na escola, mas têm desempenho ruim ou faltas constantes. Nem contabiliza os afazeres domésticos, as atividades informais e o enorme contingente de crianças e adolescentes explorados sexualmente. Por ser uma atividade ilícita, a exploração é órfã de informações precisas. Os registros mais utilizados vêm de ligações do Disque 100, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Como a denúncia não ocorre sempre que o crime é cometido, muita gente fica de fora.

Nas ruas de Fortaleza, adolescentes são
 explorados sexualmente em troca de dinheiro.
Antônio* é morador da periferia de Fortaleza e filho de pais usuários de drogas. Passava fome quando, aos 11 anos, largou a escola para vender doces no sinal. Foi abordado no local por uma mulher que passou a procurá-lo e a lhe dar presentes e dinheiro em troca de sexo. A partir daí, o menino ingressou na exploração sexual e não voltou aos estudos. José* nasceu em outra periferia, a de Belém. O garoto foi abusado na infância. Na adolescência, tinha conflitos com o pai, que não aceitava sua homossexualidade. Teve dificuldades para progredir na 5ª série e deixou a escola. Aos 11, já era explorado sexualmente. Quando os pais se separaram, a mãe o deixou em um abrigo. Atualmente tenta reconstruir a vida, namora e participa de um projeto para elevar sua escolaridade. "Hoje eu não faria sexo por dinheiro, a não ser que não tivesse outra opção", conta. 

Entre as possíveis causas da exploração sexual, a pobreza e a ausência de uma boa estrutura familiar se destacam. "Há casos em que a família procura o conselho tutelar para entregar a criança e dizer que não consegue educá-la", relata Monalisa Cardoso, coordenadora de projetos da ONG Amici di Bambini. "O conselho acaba vendo outros problemas reunidos, como alcoolismo e violência doméstica", explica ela.

O abuso sexual que surge em casa é entendido pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) como uma porta de entrada para a exploração. 

Maria* foi abusada pelo pai na infância, deixou a escola na 3ª série do Ensino Fundamental e passou a morar na rua, onde foi prostituída. Viveu assim até os 13 anos, quando o Ministério Público (MP) tomou conhecimento do caso e a encaminhou para uma casa de acolhimento. Lá, ela encontrou dificuldades para se adaptar à rotina e teve crises de abstinência alcoólica. Com o tratamento químico, a melhora foi parcial. A garota, hoje com 17 anos, está casada e tem um filho, mas não conseguiu mais retomar os estudos. 

O preconceito piora a questão ao considerar o envolvimento com a prostituição uma ação voluntária de quem é preguiçoso. Não raro, a violação de seus direitos não é compreendida pelas vítimas. "Algumas demoram para entender que eram exploradas, que o direito existe e um adulto, maior e responsável, agiu contra ela", conta Marisa Mohedano, assessora de projetos sociais do Vira Vida, do Serviço Social da Indústria (Sesi). 

*Para preservar a identidade dos entrevistados, os nomes são fictícios.

Camila Camilo (camila.camilo@fvc.org.br). Colaborou Bruna Nicolielo, de Feira de Santana, BA


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